Aldeias Históricas de Portugal

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Aldeias Históricas de Portugal

Foram centros de poder municipal, locais estratégicos de defesa das nossas fronteiras, dioceses históricas ou, simplesmente, locais pitorescos que nos fazem sentir em contos de fadas. Hoje falaremos das Aldeias Históricas de Portugal, outra rota de interesse para todos aqueles que se sintam interessados em descobrir o mais profundo e genuíno interior do nosso país.

 

Municípios antigos e um presépio em tamanho real

Por mera orientação geográfica, começaremos pela faixa mais ocidental e, numa primeira fase, seguiremos de norte para sul. O ponto de partida será roteiro Marialva e o seu castelo. Da antiga sede de concelho (1157 a 1855) resta apenas um pequeno casario protegido por um castelo roqueiro e dentro das suas muralhas, para além das ruínas de antigas habitações, encontra-se a igreja de Santiago. A vista do castelo, que abrange aldeias vizinhas, é excelente. Seguindo para sul chegamos a Trancoso, o único dos 12 lugares com estatuto de cidade. O seu centro histórico conserva praticamente a totalidade da sua muralha que foi edificada por ordem de D. Dinis e que, em conjunto com o seu castelo, faz parte do sistema defensivo da antiga vila medieval. Desta muralha, destacam-se pela sua monumentalidade as portas d’El Rey, que exibem as armas dos reis de Portugal.



Continuando descendo alcançamos Linhares da Beira. Esta freguesia, hoje pertencente a Celorico, foi concelho até 1855 (foral de 1169) e nela ainda podemos ver o seu impressionante castelo medieval ao alto de um afloramento granítico que domina a paisagem desde longínquas distâncias. Dele se pode, ver as suas muralhas interiores bem como a sua torre de menagem românica. As suas casinhas graníticas são igualmente um cartão de visita! A sudoeste, sempre ao largo da Serra da Estrela e alcançando a Serra do Açor, chegamos à idílica aldeia do Piódão. Vista ao longe, parece-nos uma autêntica aldeia-presépio, com as suas casinhas xistosas ao longo de uma vertente inclinada da serra, numa mancha negra que apenas é interrompida pela brancura da sua igreja matriz caiada de azul e branco. De todos os locais da lista, é a única que não está protegida por um castelo, mas não faltam motivos para uma visita.




Beira Baixa, e a aldeia mais portuguesa de Portugal

Saindo do Piódão, vamos em direção à serra da Gardunha até alcançarmos Castelo Novo. Nesta encantadora aldeia somos absorvidos pela frieza da sua arquitetura totalmente granítica e com certa monumentalidade. Chegados ao Largo da Praça encontramos alguns dos ex libris da localidade – a antiga Casa da Câmara, o velho pelourinho manuelino e o chafariz de D. João V. Subindo até ao castelo, outrora pertença à ordem dos templários, somos surpreendidos pela sua estrutura defensiva. Igualmente de interesse é o Cabeço da Forca, local onde noutros tempos eram executados os condenados à morte. O próximo destino será a vila de Idanha-a-Velha. Com fundação romana e ocupação sueva e visigótica, Idanha, ou Egitânia, foi sede episcopal desde os mais longínquos tempos e sede de concelho até finais do século XIX, quando perdeu esse estatuto para Idanha-a-Nova. 



Ao nível patrimonial abundam os testemunhos materiais dos vários períodos temporais: conserva a sua muralha e portas romanas, uma ponte do mesmo período e ainda uma notável coleção de aras e estelas do período romano; um batistério suevo; a antiga Sé Catedral, construída no século IX, a torre templária, o seu pelourinho manuelino ou ainda o solar da família Marrocos. Ainda no concelho de Idanha-a-Nova encontra-se Monsanto. Em 1938, o Estado Novo promoveu um concurso a nível nacional para escolher a aldeia mais portuguesa de Portugal, concurso esse ganho precisamente pela aldeia de Monsanto que, ainda hoje, exibe orgulhosamente na torre do relógio o Galo de Prata, autoria de Abel Pereira da Silva, e que foi entrege à aldeia vencedora. Aqui podemos encontrar múltiplos chafarizes que outrora abasteceram a população do antigo concelho. Existem também diversas capelas da qual destacamos a capela de São Miguel, templo construído em finais do século XII. Entre as casas, destacaremos as habitações do médico e escritor Fernando Namora e do cantor José “Zeca” Afonso. O Seu pelourinho é uma singela marca da antiga representação municipal, e as ruínas do seu castelo, destruído no século XVIII, dizem-nos bem da importância estratégica que esta aldeia teve no passado.

 



Rota Judaico-árabe

Desde cedo que a relativa intolerância religiosa vivida na sociedade portuguesa levou a que as ditas minorias procurassem refúgio longe dos centros urbanos. Na Sortelha podemos encontrar algumas casas que em tempos pertenceram a muçulmanos bem como a toponímia (exemplo da Rua da Mesquita), mas há muito mais para visitar aqui. Na verdade, esta antiga sede concelhia (séc. XII ao séc. XIX) mantém praticamente inalterado o seu casario medieval. A sua paisagem é marcada por inúmeros penedos graníticos sobre os quais os habitantes foram construindo as suas alongadas habitações de maneira a captarem os raios solares, razão pela qual ainda hoje essas casas são chamadas de “lagartixos”. No Largo do Pelourinho, encontramos a Casa da Câmara e a antiga cadeia da vila que, em conjunto com o próprio pelourinho constituem um interessante conjunto do período manuelino. O Castelo e as muralhas conservam grande parta das suas antigas portas e calçadas. Em 1492, os Reis Católicos assinam os éditos de Alhambra e expulsam os judeus dos territórios castelhanos. Parte dessa população parte para Portugal à procura da de estabilidade e vão fixar-se nas populações fronteiriças onde, com alguma esperança, esperavam que essa expulsão fosse revertida. Não só não o foi como mais tarde D. Manuel de Portugal, pressionado pelos seus vizinhos espanhóis, viria também ele a ordenar a conversão obrigatória dos judeus ou a sua expulsão definitiva. 


Muitas destas comunidades arriscaram uma vida dupla de falsa conversão (o que viria a dar muito trabalho à Inquisição…) e mantiveram as suas residências no interior de Portugal, sendo Belmonte a maior dessas comunidades. Há dois temas incontornáveis quando falamos de Belmonte: os Judeus, e o seu filho mais famoso em todo o mundo – Pedro Álvares Cabral. Aqui vamos encontrar a Sinagoga Bet Aliahu e o museu judaico, testemunhos de uma comunidade fundamental no tecido demográfico e económico da vila. Mas também podemos visitar o Museu do Novo Mundo, dedicado à descoberta do Brasil, ou não tivesse aqui nascido o seu descobridor, e onde se pode também encontrar a Capela e Panteão dos Cabrais. No que a arquitetura militar diz respeito, temos de falar do Castelo, com a sua belíssima janela manuelina, e a torre defensiva do período romano, a Centum Cellas, exemplar único da sua tipologia em Portugal.

 


A linha defensiva das Beiras

As três ultimas Aldeias Históricas são igualmente as que se encontram mais próximas à fronteira espanhola e rapidamente encontramos a justificação para o seu aparato defensivo. Começando por Castelo Mendo, encontramos uma povoação ainda de feições medievais fortemente protegida por duas linhas de muralhas: a cidadela, de traço oval foi formada após o foram de D. Sancho II; e o burgo novo, ou arrabalde, do tempo apresenta uma cintura de muralhas dionisinas, chegou a ser protegida por oito torres defensivas que, mau grado, ruíram na sua quase totalidade após o terramoto de 1755. O núcleo urbano em si é um excelente testemunho dos tempos antigos, conservando as calçadas e portas medievais (destaque para as Portas da Vila), bastantes exemplares de casas quinhentistas e manuelinas e o seu pelourinho, capelas, a sua igreja matriz do século XIV.



De todas as Aldeias Históricas que temos analisado, Almeida, até pela sua posição estratégica, é aquela que apresenta um sistema defensivo mais moderno e adequado a resistir a ataques de artilharia. Após a Restauração da Independência (1640) Almeida reformulou a sua praça forte adotando uma planta hexagonal de seis baluartes entrepostos com seis revelins, que forma uma harmoniosa estrela de 12 pontas. A sua posição estratégica esta igualmente plasmada no número de casas brasonadas que se podem encontrar no seu núcleo antigo, assim como no número de templos religiosos, do quais destacamos as igrejas Matriz e da Misericórdia. A praça alta, o picadeiro do Rei, o paiol, as portas duplas e os diversos quarteis são também linhas testamentais da importância desta cidade no panorama militar nacional. O seu castelo explodiu em 1810 aquando da III invasão francesa, mas as suas ruínas são monumento nacional desde 1928.




A última paragem deste roteiro será Castelo Rodrigo. Situado no território de Riba-Côa, Castelo Rodrigo foi conquistado aos mouros no século XI e recebeu carta de foral pelo rei leonês Afonso IX e integra o território nacional desde 1297, após a assinatura do tratado de Alcanices por D. Dinis, que lhe renovou a carta de foral. O sistema defensivo de Castelo Rodrigo é feito através do seu castelo, torres e muralhas, marcadas pelas suas bombardeiras cruzetadas. A herança judaica também é observável por aqui: a judiaria e casa do rabino, que funcionou de sinagoga, atesta a presença de uma comunidade de judeus de onde, por exemplo, saiu Efraim Bueno, cristão-novo que por aqui nasceu e fez carreira como médico em Amesterdão.  No plano administrativo, temos a Casa da Câmara e a Casa da Cadeia, bem como o seu pelourinho manuelino e a cisterna, que se acredita ser o reaproveitamento de um templo judaico. Por fim, recomendamos uma visita ao mosteiro de Santa Maria de Aguiar, mosteiro masculino da ordem de Cister, com uma igreja em cruz latina de três naves e transepto.